O Núcleo LGBTQIA+ do PSOL de Feira de Santana discursa contra a LGBTfobia na Câmara Municipal

ASCOM Jhonatas Monteiro

O Núcleo LGBTQIA+ do PSOL de Feira de Santana utilizou a Tribuna Livre da Câmara Municipal nesta quarta-feira (30) para denunciar a violência sofrida por esta população e apresentar sua pauta de luta no município. A iniciativa faz parte das ações do nosso mandato e do Núcleo neste mês de junho, que é o mês do orgulho LGBTQIA+.

O militante Denilson Lima Santos falou enquanto representante do Núcleo e apresentou dados de crimes de homo e transfobia no Brasil, além de abordar o histórico de resistência da população LGBTQIA+ tanto aqui quanto em outros países.

Dentre as reivindicações apresentadas por Denilson estavam a criação de políticas públicas voltadas para o atendimento em saúde e garantia de emprego para a população LGBTIQIA+, além de políticas sociais voltadas para pessoas travestis e transexuais em situação de rua e combate à violência LGBTfóbica.

A Câmara Municipal de Feira de Santana diversas vezes foi palco para a propagação de discursos de ódio contra minorias sociais, muitas vezes proferidos pelos próprios agentes públicos, mas o tempo em que esse tipo de violência ficava sem resposta acabou!

Seguimos juntas, juntos e juntes, enfrentando o conservadorismo e lutando por direitos e em defesa da vida e da diversidade!


Leia ou assista o discurso completo abaixo!

Parem de nos matar, queremos viver!

Denilson Lima Santos

Excelentíssimo senhor presidente da Câmara de vereadores; Excelentíssimos membros da mesa diretora; Demais excelentíssimos vereadores e vereadoras desta casa e em especial o excelentíssimo Jhonatas Monteiro, nossos vereador.

Prezadas pessoas cidadãs de Feira de Sanatana,

Nosso bom dia e agradecimento pela cessão deste espaço.

Queríamos estar aqui, neste momento, divulgando dados que fossem significativos e de grande alegria para a população LGBTQIA+. Queríamos estar celebrando os baixos índices de violência contra nós; o acesso à saúde, à educação e ao direito de caminhar nas ruas de Feira de Santana sem sermos agredidos. Enfim, falando que erradicamos a lgbtfobia. No entanto, se voltarmos nossos olhos para pesquisas sobre a parcela da população LGBTQIA+, veremos que de nossas manas, manos e manes não têm acesso às políticas públicas, à saúde, ao emprego, à educação, finalmente, acesso e direito a uma vida digna.

Esse é o quadro da nossa realidade. Diga-se de passagem, de nossa triste realidade. Se abrirmos as páginas dos jornais podemos ver notícias como essas: Jovem trans é morta com vários tiros perto de casa em Piripiri (Maria Eduarda, de 22 anos, assassinada em Piripiri, no Piauí, em 24 de junho de 2021); Jovem trans é assassinada com tiro no pescoço em Juazeiro do Norte, no interior do Ceará (Luana, 20 anos, Juazeiro do Norte, CE. Assassinada em 26 de abril de 2021); Mulher trans queimada viva no Recife tem braço amputado e segue internada em estado grave (Roberta Silva, de 32 anos, precisou ter os braços amputados e está internada em estado grave, devido às queimaduras sofridas  no dia 25 de junho de 2021). São apenas três notícias que têm sido corriqueiras no dia a dia, mas que, tenebrosamente, têm causado pouquíssima indignação. O que mais é estarrecedor é que a sociedade não se comove, não faz manifestações, tais como “somos todos…”. A empatia nos abandonou e celebramos a falta de amor ao próximo. Nós nos conformamos com as violações à vida. Mas temos que mudar essa realidade. Ela é histórica, portanto passível de transformações. 

Ante a tantas notícias, seguimos sendo dados no mapa da violência, pois a Bahia, em 2017 teve o registro de 520 atos violentos contra pessoas trans e 6.316 contra pessoas homo/bi. Pesquisa divulgada em 2019 relata que depois das eleições de 2018, “92,5% dos entrevistados relataram terem percebido o crescimento da violência para este grupo (LGTQIA+)”.Quais seriam as razões do aumento da violência depois das eleições de 2018? (Pergunta retórica). 

Outro ponto importante a ser refletido nesse dia, senhores, é a falta de trabalho para essa população (sendo que mulheres trans são as mais afetadas). Não se tem um único projeto nesse município que fomente o emprego para a população trans e novamente reitero: é este o grupo de pessoas que mais sofre altos índices de violência. São elas que diariamente têm seus corpos dilacerados e expostos. São brutalizadas e vítimas de uma transfobia legitimada, inclusive, por líderes religiosos e políticos desse país. Queremos ressaltar, senhores aqui presentes, que esta casa pode e deve legislar para mitigar os problemas da população LGBTQIA+ que são vulneráveis nas ruas. Essa camada da população é a que mais sofre preconceitos pelo simples fato de existir e ousar ser quem somos. Esta casa, “A casa do povo”, ao propor leis e sobretudo fiscalizar os cumprimentos destas, está cumprindo o seu papel de defender os interesses dos cidadãos feirenses, pois somos parte deste contingente que vive, luta e sobrevive aqui na Princesa do Sertão. 

Talvez, muitos aqui possam se perguntar: mas o que temos nós a ver com isso? Tudo. Em Feira de Santana é recorrente a violência contra nós LGBTQIA+. Desde agressões físicas e simbólicas à negação de sermos chamados por nossos nomes sociais. 

Muitas vezes nossos irmãos, irmãs e irmanes trans são desrespeitados quando precisam utilizar serviço médico. Há que se ressaltar aqui que falta também serviço médico público especializado para atender à população trans. Quando um de nós consegue acesso a tal serviço, sofre o constrangimento de não sermos respeitados pela nossa identidade de gênero. 

Mas que Feira de Santana queremos? Queremos uma Feira muito mais democrática, que respeite a diversidade; que cuide de seus filhos e os acolha. Neste mês de junho, quando celebramos o mês do orgulho gay, fato deflagrado com a revolta de Stonewall em Nova York — aqui faço uma digressão sobre esse fato, pois foi no dia 28 de junho de 1969 que a população LGBTQi+ da cidade Nova York se revoltou contra as batidas policiais que invadiam bares e agrediam donos e clientes gays que frequentavam os bares daquela cidade. Foi preciso se revoltar para começarem a respeitar nossos direitos. Rendo aqui minha homenagem a todes que ousaram lutar para que hoje nós estivéssemos aqui na tribuna desta respeitável casa e estivéssemos, sobretudo, nas ruas lutando por liberdade. Nossos respeitos aos primeiros LGBTQIA+ que encamparam a luta aqui nessa terra tropical, nomeada de Brasil.

O que queremos é reafirmar nossa pauta constante de luta pelo direito de existir e sermos quem somos. Queremos frisar que neste mês celebramos com orgulho de sermos quem somos, mas com a clareza de que é um mês de luta, pois cotidianamente sofremos todo tipo de violência:

O que Feira de Santana pode fazer por nós LGBTQiA+? Precisamos de ações como:

1- Criação de uma casa-abrigo para a nossa população, principalmente para as manas, manos e manes que vivem em situação de rua;

2 – Políticas de assistência de saúde, tal como um ambulatório especializado para pessoas LGBTQIA+;

3 – Ações para auxiliar às travestis que vivem em situação de rua;

4 – Fomentar e incentivar a geração de emprego para nossa população LGBTQIA+;

5 – Garantir a educação integral para essa parcela da população;

6 – Incentivar campanhas públicas que combatam a violência que sofremos cotidianamente nas ruas;

Não queremos, senhores, que distorçam nossa pauta de identidade de gênero. Essa questão é polemizada e está eivada de preconceitos. Identidade de gênero é respeitar a forma de existir de cada um de nós, como nos identificamos. Aqui explico o significado de cada letra de nossa Sigla LGBTQIA+: 

“L: lésbica; é toda mulher que se identifica como mulher e têm preferências sexuais por outras mulheres.

G: gays; é todo homem que se identifica como homem e têm preferências sexuais por outros homens.

B: bissexuais; pessoas que têm preferências sexuais pelo gênero masculino e feminino. 

T: transexuais, travestis e transgêneros; pessoas que não se identificam com os gêneros impostos pela sociedade, masculino ou feminino, atribuídos na hora do nascimento e que têm como base os órgãos sexuais. 

Q: queer; pessoas que não se identificam com os padrões de heteronormatividade impostos pela sociedade e transitam entre os “gêneros”, sem também necessariamente concordar com tais rótulos. 

I: intersexo; antigamente chamadas de hermafroditas, são pessoas que não conseguem ser definidas de maneira distinta em masculino ou feminino. 

A: assexuais; que não sentem atração sexual por ninguém, podendo ou não se interessar por envolvimentos românticos; 

+: engloba todas as outras letrinhas da sigla, como o “P” de pansexualidade, que é a atração por pessoas, independentemente do gênero ou da orientação sexual delas”. 

Tudo isso é diferente de educação sexual, nossa outra bandeira de luta.  Educação sexual significa educar para evitar violências e abusos sexuais, principalmente contra crianças e adolescentes. 

Diante disso, queremos dizer que continuaremos em luta por respeito e dignidade. Continuaremos construindo um país e uma cidade democrática e plural. Pela memória de Marielle Franco (vereadora da cidade do Rio de Janeiro, assassinada em 14 de março de 2018). Em memória de Gabriel Carvalho Garcia, de 22, foi assassinado a tiros em uma barbearia em Embu das Artes, São Paulo em 22/06/2021; Em memória da Travesti Dandara dos Santos, de 42 anos, que foi agredida e assassinada em 15 de fevereiro de 2017, na cidade de Fortaleza. Em memória de tantos, tantas e tantes outres vítimas da brutal violência contra nossos corpos. Parem de nos matar! Queremos viver!.

Para terminar, recito o poema do nosso poeta  Alex Ratts, da “Coletânea Poética Ogum’s Toques Negros”: 

ébano e púrpura

a suspensão do corpo 

ébano e púrpura

nas ruas

na pista

nas salas

no palco

se eu for essa rua, essa ladeira

me atravesse 

se eu for esse palco, essa pista

dance

se você for esta sala 

de reuniões

de aula

eu converso, eu estudo

se você for aquele livro

eu leio, eu anoto

se você for suspenso

nós o alcançamos com a mão

e dançamos

na superfície que nos resta

púrpura e ébano.

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